segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Artigo: As semanas de moda e os festivais de cinema


Estive em Gramado na última semana para cobrir o Festival de Cinema e não pude deixar de notar algumas comparações entre os festivais de cinema e as semanas de moda.

O fato que me chamou mais atenção é que festivais de cinema também lançam tendências. Ou pelo menos o Festival de Gramado lança. Se na SPFW, por exemplo, vimos roupas leves, cores claras e muito floral, Gramado mostrou filmes com cenas longas e poucos diálogos. Em vez do minimalismo ou do militarismo, que são tendências recentes no mundo da moda, o festival de Gramado deu destaque a temas como o espiritismo e os diferentes países da América Latina.

Pensando em cada filme individualmente e em seus diretores também dá para notar fatos interessantes. Nesse ano, por exemplo, o diretor revelação foi Jeferson De, que a gente pode comparar com Lucas Nascimento ou Melk Z-Da. Os grandes cineastas como Syvio Back e Geraldo Sarno surpreenderam, assim como Hussein Chalayan em sua fase minimalista. E tivemos também filmes que emocionaram imensamente o público e a crítica, como Mi Vida con Carlos, de German Berger, que podemos comparar (respeitando-se as proporções) com a Neon, por exemplo.

Ao contrário do que muitos pensam, há muitas semelhanças entre a crítica de cinema e a crítica de moda. Ambas avaliam o objeto não apenas no seu conjunto de características (como trilha sonora, iluminação, enredo, etc.) como também na sua relação com o contexto social. Isso sem falar no que esses dois tipos de evento tem em comum quanto à organização, turismo, economia, marketing, etc.

Mas, ao meu ver, as semanas de moda poderiam aprender muito com os festivais de cinema. Está certo que moda e cinema são duas coisas muito diferentes. O cinema traz reflexão, subjetividade, emoção, estranhamento, através de diferentes linguagens. A moda é, a princípio, só a moda. Apesar da grande qualidade e talento dos estilistas, são poucos os desfiles que conseguem o algo-a-mais e a profundidade que o cinema alcança. Não quero desmerecer a moda, ainda acho que os desfiles, em conjunto, são um ótimo panorama do que acontece no mundo, mas eu precisava fazer essa ressalva para prosseguir.

O que a moda precisa aprender com o cinema é que, se ela quer ser levada mais a sério, precisa dar mais espaço para o autoral. Precisamos investir em estilistas de talento que tenham algo para acrescentar, que não tenham como pensamento principal o dinheiro (isso é muito importante para a moda, eu sei), mas que procurem desenvolver seu talento sem medo e sem limitações. Também acho que é preciso investir mais nas semanas como conjunto, é preciso que os desfiles dialoguem entre si, construindo assim uma visão crítica da moda do momento. Uma boa maneira de se fazer isso é através de debates, coisa que o festival de cinema de Gramado realiza e que nos faz pensar, através de diferentes pontos-de-vista, não só nos filmes em si, mas também no mundo.

Infelizmente, o objetivo principal da moda é e sempre será ganhar dinheiro. Talvez seja preciso uma semana de moda alternativa para que mudanças ocorram, talvez ninguém tenha interesse em investir em um evento desse tipo quando se fala de moda. Mas se a moda brasileira deseja crescer, ela precisa parar de copiar as fórmulas de Paris, NY ou Milão e precisa olhar para outras alternativas, outras inspirações, que talvez venham de dentro do próprio país.

Um comentário:

  1. Ainda mais hoje que a indústria da moda é comandada pela massa consumidora, o poder de decisão do que vai ou do que não vai vender é nosso. Investir e apoiar a originilidade deve ser prioridade para as pessoas numa época de copismos.

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